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28 agosto 2022

A Independência do Brasil e a Maçonaria – II

Gonçalves Ledo, José Bonifácio e Januário da Cunha: 
articuladores da independência do Brasil

Ir:. Márcio dos Santos Gomes

Com a chegada ao Rio de Janeiro dos Decretos 124 e 125, de 29 de setembro de 1821, onde as Cortes ordenavam a abolição da regência e o imediato retorno de D. Pedro a Portugal, sujeitando a obediência das províncias a Lisboa e não mais ao Rio de Janeiro, e esvaziando, por completo, a autoridade do governo, D. Pedro aparentemente resignado começou a fazer os preparativos para o seu regresso. Ao considerar desnecessária a permanência de D. Pedro, as Cortes exigiam o seu retorno imediato também sob o pretexto de completar sua educação, já que, na opinião dos deputados, não tendo mais o Brasil um governo central, a sua presença passaria também a ser meramente figurativa.

Segundo Mary Del Priore (2012), “o Regente estava entre dois fogos: obedecer a D. João, dominado pelas cortes e obrigado a impor sanções ao Brasil, ou reagir, manifestando o desejo de independência”. A esposa de D. Pedro, princesa Leopoldina, “inicialmente pouco simpática ao movimento e desejosa de voltar à Europa, foi se dobrando aos fatos”. O cenário no segundo semestre de 1821 foi tenso. “Ora parecia que iam embarcar… ora, apoiado pelos jornais maçônicos, D. Pedro colocava-se como favorável à independência e sensível à ideia de assumir o trono do Brasil”. Os dias eram, assim, de indecisão e de insegurança.

D. Pedro, por outro lado, tinha consciência de que seu pai era um rei sem poder, decorativo e prisioneiro das Cortes. Os comerciantes portugueses e estrangeiros aqui residentes viam no retorno do príncipe o início da anarquia. Foi nesse contexto que a ideia de rompimento com Portugal começou a se fortalecer.

A partir daí se sobressai a maçonaria, com toda força e vigor. Os interesses de todos os setores envolvidos convergiam para uma independência feita sob o comando do príncipe regente D. Pedro. A reação dos brasileiros contra o decreto ordenando o retorno de D. Pedro ganha voz no discurso do maçom Cipriano José Barata, denunciando a trama contra o Brasil e publicado na íntegra, através da imprensa. Ao mesmo tempo é fundado na casa do maçom José Joaquim da Rocha o “Clube da Resistência”, depois transformado no “Clube da Independência”.

As tratativas iniciais tinham como objetivo sensibilizar D. Pedro para resistir ao comando das Cortes, convidar o Presidente do Senado, o maçom José Clemente Pereira, a aderir ao movimento, bem assim de ampliar os contados com maçons de Minas Gerais e São Paulo. Longe dos olhos das autoridades, outras reuniões de cunho maçônico eram realizadas tanto no Clube quanto no Convento de Santo Antônio, organizadas pelo Frei Francisco Sampaio.

Com a reinstalação da Loja “Comércio e Artes” em 1821, quando obteve liberdade de atuação, a maçonaria conheceu grande expansão no Brasil, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, com o tema da “independência” na pauta de todas as reuniões, onde se faziam agitação e proselitismo em favor da ideia. Alguns membros, como o liberal radical Joaquim Gonçalves Ledo, eram partidários de uma independência democrática e republicana, conhecida desde o século anterior como “Maçonaria Vermelha”, em contraposição ao grupo simpático à “Maçonaria Azul”, que defendia a proposta de uma monarquia constitucional parlamentar. Em comum, os grupos tinham o absolutismo como inimigo, e o liberalismo e a representação do povo no legislativo como princípios fundamentais.

A partir de outubro daquele ano começaram a aparecer pelas ruas do Rio de Janeiro panfletos denunciando as intenções recolonizadoras das Cortes e concitando o príncipe a assumir a direção do movimento em defesa da autonomia do país (Motta, 1972). Segundo Tito Lívio e Manoel Rodrigues Ferreira (1972), “insuspeitos historiadores”, nas palavras de Castellani (1993), a propaganda deflagrada pela maçonaria “vermelha” era, sim, para separar politicamente o Brasil de Portugal, pois a independência já fora considerada conquistada desde 1815. Para esse grupo, com a separação, surgiria fatalmente a república, pois não havia no Brasil uma monarquia própria.

Três representações foram encaminhadas a D. Pedro, rogando a sua permanência no Brasil e o descumprimento aos Decretos 124 e 125. A representação dos fluminenses foi redigida pelo Frei Francisco Sampaio, Orador da Loja “Comércio e Artes”. A dos mineiros foi liderada por Pedro Dias Paes Leme, maçom e amigo de D Pedro. De São Paulo, o maçom José Bonifácio de Andrada e Silva, presidente da junta governativa da província e partidário de uma monarquia constitucional, com D. Pedro no poder, enviou o documento, em 24 de dezembro de 1821, no qual criticava duramente a decisão das Cortes de Lisboa e chamava a atenção para o importante papel reservado ao príncipe naquele momento de crise. A carta chegou às mãos do príncipe no Rio a 1º de janeiro de 1822 e foi por ele divulgada imediatamente, deixando que seu conteúdo se espalhasse entre a população, com aparência de segredo, e depois mandada imprimir na Gazeta do Rio, em 8 de janeiro (D’Albuquerque, 1973).

D. Pedro enviou correspondência a D. João em 2 de janeiro de 1822 onde se lia: “Farei todas as diligências por bem para haver sossego, e para ver se posso cumprir os decretos 124 e 125, o que me parece impossível, porque a opinião é toda contra, em toda a parte“. Enquanto isso, a princesa Leopoldina conspirava “com o Partido do Fico e afirmava que D. Pedro devia organizar o governo do jeito que quisesse.” (Del Priore, 2012).

No dia 9 de janeiro de 1822, diante de D. Pedro, na sala do trono, o maçom José Clemente Pereira, Presidente do Senado da Câmara, interpretando o pensamento geral, contido nos manifestos dos fluminenses, paulistas e mineiros, fez seu discurso pedindo a permanência do príncipe. O texto da representação, comovente, emocionou D. Pedro – e mudou o rumo da história do Brasil. Então D. Pedro, compreendendo a magnitude do evento e reconhecendo a sua responsabilidade junto ao povo brasileiro, pronuncia o que a história reconhece a data como o “Dia do Fico”: “Como é para bem de todos, e felicidade geral da Nação, estou pronto: diga ao povo que fico“. Naquele mesmo evento, D. Pedro recebera um abaixo-assinado com 8.000 nomes. Reunido defronte do Paço Municipal, o povo saudou a decisão do príncipe.

Os setores das classes médias e urbanas da época, compostos pelos jornalistas, médicos, padres, funcionários públicos dos baixos escalões, professores etc., muitos deles militantes da maçonaria e que defendiam a implantação de uma república, passaram a aceitar a monarquia constitucional com D. Pedro no poder, depois do “Dia do Fico”, devido à fraqueza das camadas médias da população. Os séculos anteriores de monarquia tinham grande influência no povão e a república era vista com desconfiança.

No dia 11 de janeiro, as tropas portuguesas tentaram obrigar o príncipe a embarcar para Lisboa. Apoiado pelo povo e por tropas leais, D. Pedro resistiu. A independência, agora, era uma questão de tempo. A petição de José Bonifácio e o abaixo assinado que resultou no “Dia do Fico” marcaram a aproximação entre D. Pedro e a elite brasileira.

Aproveitando-se do apoio da população do Rio de Janeiro, o regente demitiu o ministério deixado pelo pai e nomeou outro. Com a chegada de José Bonifácio ao Rio a 17 de janeiro, foi ele logo nomeado para chefiar o Ministério dos Negócios do Reino e Estrangeiros, sendo o primeiro brasileiro a ocupar um cargo semelhante. Ainda naquele mês, seguindo o conselho de José Bonifácio, D. Pedro assinou Decreto instituindo que só vigorariam no Brasil as Leis portuguesas que recebessem o “cumpra-se” do príncipe regente.

Em 13 de maio de 1822, por proposta do brigadeiro Domingos Alves Branco Muniz Barreto e de Joaquim Gonçalves Ledo, o príncipe regente recebe o título de “Defensor Perpétuo do Brasil”, oferecido pela Maçonaria e pelo Senado, marcando uma cartada política importantíssima da Loja “Comércio e Artes”. Por trás dessa iniciativa estava também o interesse das lideranças que pretendiam aproximar-se do regente e suplantar o prestígio desfrutado por José Bonifácio, o todo-poderoso ministro.

Dando um decisivo passo em direção à independência, em 2 de junho de 1822, José Clemente Pereira, em audiência com D. Pedro, fez saber o discurso redigido por Joaquim Gonçalves Ledo e Padre Januário da Cunha Barbosa sobre a necessidade de uma Constituinte.

Por sua vez, José Bonifácio manifestou-se contrário à convocação da Constituinte, mas acabou por aceitá-la, procurando descaracterizá-la com a proposta de eleição indireta, que acabou prevalecendo contra a vontade dos liberais radicais comandados por Gonçalves Ledo, que defendiam o princípio da eleição direta, ampliando o conflito entre ambos. Em 3 de junho de 1822 foi expedido decreto em que José Bonifácio convocou a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa. Apesar do controle da situação pelos conservadores e de o texto da Constituinte apresentar declarações favoráveis à união entre Brasil e Portugal, as Cortes insistiam no retorno imediato de D. Pedro.

Neste ínterim, fora criada a primeira Obediência Maçônica do Brasil, o Grande Oriente Brasílico (ou Brasiliano), em 17 de junho de 1822, uma entidade dedicada, com exclusividade, à luta pela independência política do Brasil. Para esse fim, a Loja “Comércio e Artes” foi dividida em três Lojas, dela saindo os maçons em número suficiente para a formação das Lojas “União e Tranquilidade” e “Esperança de Niterói”.

A administração do Grande Oriente ficou então composta por José Bonifácio de Andrada e Silva, como Grão-Mestre; Joaquim de Oliveira Alvarez, como Delegado do Grão-Mestre; Joaquim Gonçalves Ledo e João Mendes Viana, como 1º e 2º Grandes Vigilantes, respectivamente; Padre Januário da Cunha Barbosa, como Grande Orador; capitão Manoel José de Oliveira, como Grande Secretário; Francisco das Chagas Ribeiro, como Grande Chanceler; Francisco Luiz Pereira da Nóbrega, como Promotor Fiscal; João da Rocha, como Grande Cobridor; e, Joaquim José de Carvalho, como Grande Experto (Castellani, 1993).

José Bonifácio foi escolhido como Grão-Mestre pela sua dimensão, não só na política nacional como Ministro, mas, também, na europeia, pela sua atividade científica e política, durante os 37 anos em que viveu e trabalhou na Europa. Porém, a liderança dos maçons cabia a Gonçalves Ledo, seu substituto imediato. Ledo era um político fluminense, considerado a maior liderança maçônica da época, mas não tinha o prestígio nacional e internacional de José Bonifácio. Entretanto, Ledo, como líder do Grande Oriente, teve um papel destacadíssimo e, segundo Castellani (1993), pouco reconhecido nas lutas pela independência do Brasil, tendo inspirado “todas as grandes manifestações populares ocorridas no Rio de Janeiro, naqueles conturbados dias que antecederam a emancipação do país”.

Os grupos de Bonifácio e Ledo mantinham uma luta ideológica. Eram maçons em conflito, com agitação nas ruas e intrigas palacianas. Enquanto o primeiro grupo defendia a independência dentro de uma união brasílico-lusa, mais palatável, o segundo pretendia o rompimento total com a metrópole portuguesa, “o que poderia tornar difícil a transição para país independente”. Essa luta extrapolou as discussões no âmbito das lojas e assumiu caráter público e se estendeu através da imprensa (Castellani, 2007). Para José Bonifácio somente a forma de governo monárquica seria capaz de manter a unidade territorial. Ele temia as eleições diretas, opondo-se às ideias de fundo republicano (Mattos, 1991).

Entre 15 de setembro de 1821 e 8 de outubro de 1822 circulou o jornal “Revérbero Constitucional Fluminense”, redigido pelos seus editores Gonçalves Ledo e Padre Januário da Cunha Barbosa, que contribuiu significativamente para formação de um sentimento libertador. Também a partir de 29 de julho de 1822, Frei Francisco Sampaio passou a editar o jornal “Regulador Brasílico-Luso”, depois denominado, “Regulador Brasileiro”, impresso na Tipografia Nacional, que marcou presença no movimento de emancipação, mas entrou em atrito com o “Revérbero”, na defesa de José Bonifácio. Outro de destaque foi o jornal “O Constitucional”, redigido pelos maçons José Joaquim da Rocha e padre Belchior Pinheiro de Oliveira, defendendo as mesmas ideias liberais de Ledo. Curiosamente, Padre Belchior, nascido em Diamantina, vigário de Pitangui (MG), para alguns autores sobrinho de José Bonifácio e para outros um primo distante, era amigo e confidente de D. Pedro.

Por proposta de José Bonifácio, em 2 de agosto de 1822, é iniciado na Loja Comércio e Artes o príncipe regente, D. Pedro, que adotou o nome histórico ou heroico de “Guatimozim”, em referência ao último imperador Asteca morto em 1522. O Rito adotado à época ensejava tal escolha (Bonifácio era “Tibiriçá” e Ledo era “Diderot”). Tal fato não deixou de ser um ato político, pois à Maçonaria era importante ter o regente nas suas fileiras, onde poderiam influenciá-lo no caminho da emancipação e, para D. Pedro, estando entre os maçons melhor poderia atuar na busca de uma solução monárquica para o país, afastando inclinações para um regime diferente (Castellani, 2007). Logo em seguida, no dia 5 de agosto, Joaquim Gonçalves Ledo, que ocupava a presidência dos trabalhos, conduziu a cerimônia de exaltação de D. Pedro ao grau de Mestre Maçom.

Segundo Laurentino Gomes (2010) há fortes indícios de que D. Pedro frequentasse as atividades da maçonaria bem antes de sua iniciação. Segundo ele, “No museu Imperial de Petrópolis há uma carta que o então príncipe regente escreveu a José Bonifácio com vocabulário e sinais maçônicos no dia 20 de julho de 1822, data anterior à sua iniciação oficial”. Diz a carta: “O Pequeno Ocidente toma a ousadia de fazer presentes ao Grande Oriente duas cartas da Bahia e alguns papéis periódicos da mesma terra há pouco vindas. Terra a quem o Supremo Arquiteto do Universo tão pouco propício tem sido. É o que se oferece por ora a remeter a este que em breve espera ser seu súdito e Ir∴ Pedro”. O autor ressalta ainda, que “No canto superior esquerdo da página, há o desenho de um sol e a palavra Alatia, em que as letras foram substituídas por esquadro, compasso, martelo, uma pá de pedreiro e um olho… A assinatura é acompanhada do símbolo ∴, os três pontinhos em forma de pirâmide que indicam filiação maçônica”. Donde se conclui que D. Pedro já era um “goteira” real.

O Ir:. Márcio dos Santos Gomes é M:.I:. da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, e membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras

Artigo originalmente publicado no blogue O Ponto Dentro do Círculo.

21 agosto 2022

A Independência do Brasil e a Maçonaria – I

Tela “Independência ou Morte” ou “O Grito do Ipiranga” (Pedro Américo)

Ir:. Márcio dos Santos Gomes

Os registros históricos revelam que as primeiras Lojas Maçônicas em nosso país foram oficialmente estabelecidas no início do século XIX. Anteriormente, consta da literatura maçônica o Areópago de Itambé, datado de 1796, uma sociedade filosófica de caráter liberal, referenciada como o embrião da maçonaria brasileira, mas incluída na categoria de sociedade secreta, além de vários clubes, academias e associações, cuja filosofia seguia o pensamento maçônico.

Outra sobre a qual recai controvérsia sob o aspecto da regularidade é a “Cavaleiros da Luz”, fundada na Bahia em 17 de julho de 1797, a bordo da fragata francesa La Preneuse, mas que seguramente teria o caráter de uma sociedade secreta com fins políticos. Tudo isso porque uma loja, para ser considerada regular, deve possuir uma carta constitutiva emitida por uma Obediência ou Potência também regular.

A Loja “União”, fundada por maçons portugueses, constituída em 1800, e considerada irregular inicialmente, foi refundada com o nome de “Reunião” no Rio de Janeiro, em 1801, filiada a uma Obediência francesa. Na sequência, constam as Lojas “Virtude e Razão” (Bahia, 1802); “Constância” e “Filantropia” (RJ, 1804), “Virtude e Razão Restaurada” (Bahia, 1807); “Regeneração” (Engenho Paulista – PE, 1809); “Pernambuco do Ocidente” e “Pernambuco do Oriente” (1812); Distintiva (São Gonçalo da Praia Grande – Niterói-RJ, 1812); Guatimosim (Recife-PE, 1812); “União” (Bahia, 1813).

O realce na cronologia das lojas sempre ficou com a “Comércio e Artes na Idade do Ouro”, fundada em 15 de novembro de 1815, no Rio de Janeiro, inativa, pelo menos aparentemente, após o Alvará Real de 30 de março de 1818, que proibiu o funcionamento das ainda incipientes lojas do território nacional, na época em que o Brasil era Reino Unido ao de Portugal e Algarve (Castellani, 1993). A Loja foi reinstalada em 24 de junho de 1821 e serviu de base para a fundação do Grande Oriente Brasileiro, em 17 de junho de 1822, entrando para a história como o pivô da Independência.

Os acontecimentos que resultaram na independência do Brasil têm como largada o ano de 1808, com a chegada de D. João ao Rio de Janeiro no dia 7 de março, depois de uma estada na Bahia, onde aportou em 22 de janeiro, sob a proteção naval da marinha inglesa, trazendo a Corte para o Brasil, em fuga da invasão e dominação de Portugal pelas tropas francesas de Napoleão Bonaparte, comandadas pelo General Junot, com o assentimento da Espanha. Tal acontecimento deu ao país nova organização administrativa nos moldes de um Estado independente e ensejando, segundo alguns historiadores, a “inversão metropolitana”, onde uma colônia passava a sediar uma corte europeia pela primeira vez na história. Naquele momento, Inglaterra e França disputavam a liderança no continente europeu. D. João não obedecera às determinações de Napoleão de fechar os portos portugueses aos navios ingleses. Ao partir, D. João deixara Portugal aos cuidados do Conselho de Regência de 1807.

A bordo dos navios que trouxeram a Corte, com a estimativa entre quatro e sete mil pessoas, excluindo tripulantes, constaram “joias da família real, arquivos importantes do governo português, homens essenciais de um Estado soberano – como as altas hierarquias civil, militar e eclesiástica -, a alta sociedade, membros de profissões liberais e do mundo dos negócios, toda a máquina do Estado estava sendo transplantada para continuar sua rotina no Brasil” (Cáceres, 1995).

Com isso, foram reconstituídos em solo brasileiro todos os órgãos do Estado português: os ministérios do Reino, da Marinha e Ultramar, da Guerra e Estrangeiros e o Real Erário, que em 1821 mudou o nome para Ministério da Fazenda. Outros órgãos da administração e da justiça foram recriados. Cada departamento, cada repartição importante foi restabelecida com as mesmas funções, o mesmo nome, os mesmos poderes e os mesmos métodos que o seu protótipo em Portugal.

Registre-se que a burocracia generalizada e ineficiente, o apadrinhamento e o nepotismo eram os mesmos existentes no modelo português, fato este que explica boa parte de nossa herança cultural. Muitos historiadores consideram D. João como o verdadeiro mentor do moderno Estado brasileiro. Caio Prado Júnior, na obra “Evolução política do Brasil (1ª ed.: 1933)”, consignou que, se não fora os aspectos externos e formais, a transferência da corte poderia ser caracterizada como o marco da independência do Brasil.

A chegada da Corte promoveu mudanças que redundaram em progresso, através de inúmeras medidas adotadas, como a carta-régia de 28 de janeiro de 1808, que permitiu a abertura dos portos brasileiros às nações amigas, considerado como um referencial de transição do Brasil, de colônia a Estado soberano; o alvará de 1º de abril, revogando o de 1785, que proibia a instalação de manufaturas; a criação do Banco do Brasil, em 12 de outubro de 1808, e, finalmente, a importantíssima lei de 16 de dezembro de 1815, que elevou o país à categoria de reino: Reino Unido a Portugal e Algarves, legitimando a permanência da Corte no Brasil e favorecendo a ruptura colonial sem graves convulsões sociais, sem fragmentação territorial e com unidade politica. Conforme alguns historiadores, com esse ato D. João tornou o Brasil independente dentro da Monarquia Portuguesa.

As transformações materiais foram acompanhadas de mudanças no panorama cultural, como a criação do Museu Nacional e da Biblioteca Real – futura Biblioteca Nacional, da Academia Militar, da Academia da Marinha e de escolas voltadas para melhorar a qualidade da mão de obra, como a Escola de Comércio e Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios. O ensino público melhorou com a criação de escolas de Medicina na Bahia e no Rio de Janeiro. Repercutiu positivamente a vinda de missões artísticas e científicas estrangeiras. A Academia de Belas-Artes foi criada em 1816. Cidades cresciam e foram tomadas medidas visando à melhoria das condições higiênicas e sanitárias, em especial nas cidades portuárias. Entre 1810 e 1820, o Rio de Janeiro já contava com mais de 100 mil habitantes, sendo muitas vezes identificada como uma “nova Lisboa” pelos enciumados moradores de outras partes do Brasil.

De grande relevância para a história cultural e ideológica do período foi a criação da Imprensa Régia, que quebrou a secular proibição da atividade impressora no Brasil. O primeiro jornal foi a “Gazeta do Rio de Janeiro” (1808-1822). Na Bahia, em 1811, apareceu o jornal “A Idade de Ouro do Brasil” (1811-1823). O destaque foi o “Correio Brasiliense (1808-1822)”, editado em Londres, com frequência quase mensal, pelo maçom Hipólito da Costa, brasileiro, conhecido como o “Patriarca da Imprensa Brasileira” e mentor da geração da independência. O “Correio Brasiliense” ou “Armazém Literário” era de oposição e não tinha o apoio oficial, mantendo-se dos recursos provenientes de suas vendas, e considerado, à época, o mais completo veículo de informação e análise da situação política e social de Portugal e do Brasil.

Segundo a historiadora Emilia Viotti da Costa (citada por Koshiba, 1963), “a entrada de estrangeiros em número crescente a partir de 1808, a intensificação dos contatos com a Europa facilitaram a divulgação de ideias liberais e nacionalistas, então cultivadas nas sociedades secretas que aqui também se multiplicavam”. Tudo isso propiciou à formação de uma consciência emancipacionista no Brasil.

A presença da Corte portuguesa no Brasil acabou com a importância política da região Nordeste. Por isso, um sentimento antilusitano tomou conta da Bahia e de Pernambuco, e teve papel importante no movimento revolucionário que marcou o período, a Revolução Pernambucana de 1817, de tendência fortemente nacionalista, no sentido de implantar a república em Pernambuco. Os portos nordestinos recebiam navios e comerciantes norte-americanos, a procura de mercados, que traziam artigos de jornais, livros e exemplares da Constituição norte-americana e faziam reuniões e conferências com pessoas importantes da sociedade de Pernambuco. Com as discussões sobre a Declaração de Independência e a Constituição dos Estados Unidos, muitos acreditavam que as ideias republicanas e liberais trariam o progresso e o desenvolvimento para o Nordeste.

A maçonaria e outras sociedades secretas, estimuladas pelos comerciantes e viajantes estrangeiros, se encarregaram de difundir os novos princípios liberais. O maçom Domingos José Martins, que era favorável à libertação dos escravos e a incorporação dos mesmos como soldados na luta contra os portugueses, liderou o movimento. Com a derrota do despreparado exército revolucionário, os principais chefes foram levados para Salvador, onde responderam a processo sumário (devassa), sendo todos executados, incluindo Domingos José Martins, num total de 43, entre civis e militares, bem como três eclesiásticos, dentre os quais o famoso padre Roma (José Inácio Ribeiro de Abreu e Lima), também maçom (Castelani, 1989). A Revolução Pernambucana é considerada a precursora da independência política do país, juntamente com a Inconfidência Mineira, tendo ambas o protagonismo de vários maçons que fomentaram o caminho da emancipação total.

Segundo Castellani (2007), toma-se o Alvará de 30 de março de 1818 como uma consequência direta da fracassada Revolução Pernambucana, ensejando medidas contra a atuação da maçonaria, ao proibir o funcionamento das sociedades secretas, abrangendo as ainda incipientes lojas do território nacional, motivado pela agitação do meio maçônico empenhado em obter a independência do Brasil, através de movimentos regionais nacionalistas, de caráter geralmente republicano. O Alvará mostrava o empenho de D. João em fazer uso da força contra qualquer nova tentativa de rebelião, com a participação das hostes maçônicas. Não obstante o recesso oficial, a maçonaria continuou a trabalhar secretamente.

Desde 1809, Portugal estava libertado, pelos ingleses, do domínio francês. O general William Baresford, da Inglaterra, com o título de “Lorde Protetor”, era o virtual ditador, com o consentimento de D. João, enquanto este e sua Corte permaneciam no Brasil, com prejuízos para a burguesia comercial portuguesa, para a qual interessava a volta da família real para Lisboa e o restabelecimento do exclusivismo comercial da metrópole sobre a colônia.

Naquele momento, “Embora consideradas criminosas e proibidas em Portugal, as sociedades secretas e a Maçonaria se desenvolviam e difundiam ideias liberais nas grandes cidades. Combatiam o absolutismo, a sociedade tradicional, as superstições e a intolerância religiosa. A Maçonaria não era antibritânica, porque contava com muitos membros ingleses. Mas as outras sociedades secretas, como o Sinédrio, que pretendiam libertar Portugal da dependência inglesa, eram claramente antibritânica.”(Cáceres, 1995).

Como resultado da vitória da Revolução Liberal do Porto conduzida pelos militares, culminando com a expulsão dos ingleses, em 1820, e a consequente formação das “Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa”, como o primeiro Parlamento convocado em Portugal, à revelia de D. João, a permanência da Família Real no Brasil tornou-se motivo de enorme insatisfação, pois a colônia, então equiparada à metrópole, estava a um passo de sua emancipação, e isso feria o orgulho português.

A Revolução do Porto pôs fim ao período de relativa estabilidade política que o Brasil havia conhecido desde a chegada da família real, gerando tumultos, passeatas, pronunciamentos militares e rebeliões em várias partes do país, forçando D. João, a partir de então, com o título de rei e o nome de D. João VI, a jurar a nova Constituição que estava sendo elaborada em Portugal, deixando de ser um monarca absolutista e tornando-se rei constitucional. A pressão das Tropas portuguesas sediadas no Rio de Janeiro foi decisiva para a decisão de D. João. Sua volta passou a ser exigida, apesar da vontade em permanecer no Brasil.

Embora criando uma monarquia constitucional e derrubando o absolutismo, as Cortes em Portugal sempre declararam lealdade ao rei D. João. Entretanto, crescia ainda a preocupação de seus membros com as perdas das riquezas provenientes do Brasil. Vale ressaltar que a Inglaterra dominava o comércio exterior brasileiro.

Assim, atendendo à exigência das Cortes e com o receio de perder o trono, em função do decreto-régio de 7 de março de 1821, e pressentindo a possibilidade de o Brasil tornar-se independente, D. João nomeou como regente do Reino do Brasil seu filho e herdeiro, D. Pedro, aos 22 anos de idade. Ao partir, em 26 de abril de 1821, D. João recomendou a seu filho: “Pedro, se o Brasil se separar, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para alguns desses aventureiros”. A esquadra, composta por duas fragatas e nove embarcações de transportes, levou 40 mil pessoas. D. Carlota Joaquina exultante, partiu maldizendo o Brasil. D. Pedro acompanhou o pai até a saída da barra. (Del Priore, 2012).

Dessa forma, o príncipe regente vê-se envolvido pela elite pensante e econômica local, dentre os quais um forte grupo político composto por vários maçons. Já naquela oportunidade, o Banco do Brasil se viu desfalcado de mais de cinquenta milhões de cruzados em barras e moedas de ouro que haviam sido levadas por D. João dentro de suas malas, inaugurando procedimento que se “repete” ainda nos dias atuais. Para contornar a situação, D. Pedro ordenou a emissão de mais papel-moeda, o que causou a desvalorização da moeda e a elevação dos preços, inoculando o veneno da inflação. Qualquer comparação com a história recente não é mera coincidência.

Ainda em abril de 1821, um decreto das Cortes anulou o ato que havia nomeado D. Pedro regente. Decidiram, ainda, que o Brasil não apenas deixaria de ser um reino unido a Portugal como também o vice-reinado, com sede no Rio de Janeiro, não seria restabelecido. Em substituição a um governo central, o Brasil seria divido em províncias autônomas, cujos governadores (militares) seriam nomeados pelas próprias Cortes. Foi determinada a eliminação de todos os tribunais de justiça, das agências e das repartições públicas estabelecidas depois de 1807. Ademais, estavam sumariamente demitidos todos os juízes, advogados, escreventes e burocratas que ocupavam esses postos (Bueno, 1997).

O Ir:. Márcio dos Santos Gomes é M:.I:. da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, e membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras

Artigo originalmente publicado no blogue O Ponto Dentro do Círculo.


20 agosto 2022

Potências regulares comemoram o Dia do Maçom

Ir:. Ozair Filho (centro) conduziu a Sessão Comemorativa 

O Grande Oriente do Rio Grande do Norte comemorou ontem o Dia do Maçom, que transcorre neste sábado, 20 de agosto, em Sessão Comemorativa que foi dirigida pelo Sereníssimo Irmão José Ozair Pinto Filho, Grão-Mestre.

A sessão reuniu 145 Irmãos integrantes de delegações de todas as Potências Maçônicas Regulares que atuam no Rio Grande do Norte - GLERN, GOB e GORN - além de visitantes de outros Orientes.

O Secretário de Administração do GORN, Ir:. Francisco Assis Araújo, fez palestra sobre O Dia Nacional do Maçom, oportunidade em que falou sobre a importância da Maçonaria, uma das instituições mais antigas em atividade no mundo, guardiã dos princípios da ética e moralidade, que ajuda a humanidade a evoluir desde a sua criação.

Também participaram da comemoração os Grão-Mestres da GLERN, Ir:. Robert Hook Menescal Pinto, do GOB-RN, Ir:. José Ivo de Souza e do Grande Oriente da Paraíba, Ir:. Onildo Silva Almeida Filho, acompanhado do seu Adjunto, Ir:. Almir Araújo.

Os outros poderes maçônicos do GORN foram representados pelo Ir:. Núbio Fonseca de Melo, presidente, da Assembleia Legislativa, Ir:. Agnelo Pinto, do Tribunal de Justiça, Ir:. José Moraes, vice-presidente do Tribunal Eleitoral, o Ir:. Jaciratan Ramos, Procurador-Geral, além de Conselheiros, Juízes, Delegados e Veneráveis.




Depois da solenidade, os Irmãos presentes se confraternizaram nos salões e na área externa do GORN, em um clima de harmonia fraternal (clique AQUI e veja todas as fotos da Sessão)

História - A história maçônica registra que no dia 20 de Agosto de 1822 houve uma sessão histórica entre as Lojas “Comércio e Artes” e “União e Tranquilidade”, no Rio de Janeiro.

Na ocasião, o Irmão Gonçalves Ledo, político e jornalista e um dos mais importantes Maçons da época, fez um discurso emocionante e inspirador, e pediu a Independência do Brasil ainda naquele ano.

A ideia do Ir:. Gonçalves Ledo foi aprovada por todos os Irmãos presentes à Sessão, e foi registrada na ata do Calendário Maçônico no 20º dia, do 6º mês do ano da Verdadeira Luz de 5.822.

A data, convertida para o calendário gregoriano, seria equivalente ao dia 20 de Agosto de 1822.

Impulsionado pela Maçonaria, o Príncipe Regente Dom Pedro I proclamou a Independência do Brasil no dia 7 de setembro de 1822, menos de um mês depois da grande reunião no Rio de Janeiro.

A data foi registrada no artigo 179 da Constituição do Grande Oriente do Brasil, tornando oficialmente o 20 de agosto o Dia do Maçom Brasileiro.

01 agosto 2022

Mensagem do Grão-Mestre/Julho-2022

 

Meus Irmãos, O sentimento que permeia entre nós deve ser o de gratidão por tudo que passamos até aqui, por todas as vitórias alcançadas e obstáculos vencidos, ser Maçom é um compromisso que exige dedicação e disciplina, numa luta incessante como defensor do que é Justo e Perfeito, priorizando sempre nossos Princípios e Leis.

Sempre com a intenção de buscar o progresso é que a nossa Sublime Ordem deve avançar e, nessa seara, surgiu a necessidade de um direcionamento por parte da COMAB, CMSB e do GOB, que resultou na 1ª Conferência Brasileira da Maçonaria Regular e Reconhecida, evento realizado para discutir temas de grande relevância maçônica ocorrido em 15 de julho, no Oriente de Florianópolis/SC, onde o GORN foi dignamente representado pelo nosso valoroso Irmão Antônio de Brito Dantas, Ex-Grão-Mestre e atualmente exercendo o cargo de Gr.·. Sec.·. de RRel.·. EExt.·. e nesse sentido registro os nossos agradecimentos.

Almejando incansavelmente a integração e a eficiência, continuamos com o ciclo de  capacitação nas Lojas, prova disso foi o Curso de Administração oferecido pelo Grande Oriente do Rio Grande do Norte no dia 23 de julho na Loja João da Escóssia, Oriente de Mossoró/RN, contando com a presença de 36 valorosos Irmãos das regiões do Oeste e Alto Oeste, com a pretensão de que os significativos conhecimentos adquiridos resultem em melhorias no tocante à gestão das Oficinas.

Informamos que as reuniões dos Conselhos de Veneráveis e Geral acontecerão na Loja “24 DE JUNHO”, Oriente de Mossoró/RN, no dia 03 de setembro, às 10:00 horas, sendo disponibilizado o transporte, por adesão, com saída do GORN às 05:00 horas, para maiores esclarecimentos manter contato com o Irmão Assis através do número (84) 98779-9356.

É muito importante que as Oficinas atentem para a situação referente aos maçons irregulares com o objetivo de participar das sessões, o que deve ser fiscalizado e plenamente combatido através das medidas essenciais como identificação e verificação da regularidade.

Avancemos promovendo o bem, alimentando a esperança em um futuro promissor e confiante no novo dia que surge, que o Grande Arquiteto do Universo nos abençoe com Sabedoria, Saúde, Paz