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24 novembro 2009

Proposições em Loja – 1ª Parte

Comentários aos artigos 222 e 223 
do Regulamento Geral do GOIERN


George Macedo Heronildes*

Ao iniciar na Maçonaria, interessou-me o estudo de sua história, tanto que o abordei em meu trabalho de exaltação.

Todavia, com o decorrer do tempo e, consequentemente, da frequência nas sessões, sem esquecer da primeira afinidade cognitiva, fui atentando para as proposições feitas em Loja, posto verificar implicarem, seja mediata ou imediatamente, a  concretização dos objetivos maçônicos, para os quais procuramos nos aperfeiçoar em constante processo de aprendizado.

Nomeado para compor a Comissão de Legislação e Justiça da Augusta e Benfeitora Loja Simbólica Padre Miguelinho, resultou-me atribuído, obviamente, o dever de estudar o assunto, notadamente sob a lente da sua regulamentação, o que me instigou a elaborar o presente trabalho.

Encontram-se no Título IV (Das Lojas e dos Triângulos), Capítulo XI (Do Funcionamento das Lojas), Seção III (Das Proposições, Discussões e Votações), as normas específicas do Regulamento Geral do Soberano Grande Oriente Independente do Estado do Rio Grande do Norte – GOIERN que regulam o tema a respeito do qual passo a tecer alguns comentários. Elas estão enfeixadas nos arts. 222, com seus respectivos parágrafos, e 223, que assim dispõem:

(...)

Art. 222 – Qualquer proposição que infrinja a Constituição, este Regulamento ou outras leis maçônicas será rejeitada de pronto pelo Venerável, ouvido o Orador, cabendo recurso do interessado ao Tribunal de Justiça do GOIERN, sem efeito suspensivo.
§1º - As proposições serão apresentadas por escrito, preferencialmente, através do Saco de Propostas e Informações e, quando forem verbais, constarão do balaústre, em resumo. Em nenhuma hipótese serão acatadas proposições que não estejam devidamente assinadas por seus autores.

§2º - Apresentada a proposição e desde que esteja de acordo com este artigo, o Venerável, na mesma sessão, despacha-la-á para a Comissão competente apresentar parecer sobre o assunto, em prazo nunca superior ao de 03 (três) sessões, salvo se tratar-se de assunto urgente, quando o prazo poderá ser reduzido. Recebido o parecer, o Venerável marcará a data em que, na Ordem do Dia, a proposição será discutida e votada pelo plenário da Loja.

§3º - Não serão discutidas proposições que atentem contra a existência do GOIERN.

§4º - Qualquer proposição que onere o erário da Loja só poderá ser discutida após ouvidas as Comissões de Legislação e Justiça e de Finanças.

§5º - Havendo rejeição de matéria proposta numa sessão, só se admitirá sua reapresentação após, no mínimo, sessenta dias da data da rejeição.


Art. 223 – No encaminhamento de qualquer votação e nas conclusões do Orador não serão permitidos apartes.


(...)

Consoante prescrição contida no art. 10 da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, alterada pela Lei Complementar nº 107, de 26 de abril de 2001, o artigo (na parte que chamamos de caput ou cabeça) contém a unidade básica da articulação; é dizer, o conteúdo principal da norma, constituindo-se seus parágrafos, incisos, alíneas e itens, em desdobramentos; portanto, disposições secundárias, porém nunca desprezíveis.

Vista sob a ótica da sua literalidade, é de se constatar que a cabeça da norma contida no mencionado art. 222 atribui ao Venerável Mestre, em sessão, o poder-dever quase absoluto (pois apenas precisa ouvir o Irmão Orador) de rejeitar imediata e peremptoriamente, no âmbito da respectiva Loja, proposição que desrespeite a Constituição e o Regulamento Geral da Ordem, assim como outras leis maçônicas. Tão absoluto é este poder-dever, a ponto de sequer ser possível apartear o Orador quando de suas conclusões, conforme o art. 223 do mesmo Regulamento.

Decerto a força dessa norma, como de todo o ordenamento jurídico (posto ser o Direito uma ciência eminentemente finalística) tem sua razão de existir, porquanto são deveres constitucionais dos Maçons e das Lojas, em sua totalidade, (cfr. arts. 12 e 30 da Constituição do GOIERN) observar e obedecer a todas as leis e Poderes da Instituição. Do contrário, evidentemente, venceria a indisciplina, a desordem, o caos e, conseqüentemente, a degradação.  

Contudo, ao meu sentir, o absolutismo presente em sua letra (impondo ao Venerável que a um só golpe de malhete impeça a discussão de determinada proposta) não guarda simetria com o arejamento do regime democrático o qual felizmente alcançamos, que possui, dentre os seus pilares, a liberdade de pensamento e manifestação (cfr., nos Títulos I e II da Constituição Federal, que tratam respectivamente dos Princípios Fundamentais e dos Direitos e Garantias Fundamentais, os seus arts. 1º e 5º, inc. IV). Aliás, em homenagem a essas novas circunstâncias, cabe ilustrar, o Ministro AIRES BRITO, do Supremo Tribunal Federal, ao votar contra a vigência da Lei de Imprensa, afirmou que esta fora ‘... concebida e promulgada num longo período autoritário, o qual compreendido entre 31.3.64 e o início do ano de 1985 e conhecido como ‘anos de chumbo’ ou ‘regime de exceção’, regime esse patentemente inconciliável com os ares da democracia resgatada e proclamada na atual Carta Magna. ...”. (Cfr. Informativo nº 541, do STF, de 15.04.2009).

E é óbvio que a liberdade ora sob comentário estaria cerceada se alguma proposição dela oriunda não pudesse ser debatida, posto serem a troca e o embate de idéias (dialética do contraditório) os elementares meios de se chegar à verdade e ao progresso, cujos valores tanto almejamos. Um pensamento que não é discutido é uma semente fadada a não germinar e, segundo o poeta escocês THOMAS CAMPBELL “Compreender que há outros pontos de vista é o início da sabedoria.”


*MM da Augusta e Benfeitora Loja Simbólica Padre Miguelinho
(Trabalho oriundo de instrução conferida em 17/09/2009 na Loja Pe. Miguelinho, e dedicado a todos os irmãos Oradores e componentes das Comissões de Legislação e Justiça, nas pessoas do Grande Orador MI João de Deus, Grande Procurador MM Carlos Joilson, Orador MM Rodrigo Falconi, e Orador MM Gladstone Heronildes). 

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