Clique aqui

25 novembro 2009

Proposições em Loja – 2ª Parte

Comentários aos artigos 222 e 223

do Regulamento Geral do GOIERN

George Macedo Heronildes*


O fundamento da liberdade, vale salientar, não é estranho à Constituição do nosso Grande Oriente Independente, consoante se verifica nos Itens I e V dos seus Princípios Gerais; no Item VII dos seus Princípios Normativos; nos incs. I e IV, art. 13 (dos direitos de todos os maçons) e no art. 30, inc. III (dos deveres das Lojas), normatização que, em suma e combinadamente, afirma tratar-se a Maçonaria de uma Instituição progressista, defensora da plena liberdade de expressão, do pensamento e de proposições.     

Como, então, conciliar o autoritarismo da regra sob análise, com os primados democráticos aqui também expostos? (Dentre os quais eu saliento, por muito oportuno, o inscrito no já citado art. 13, inc. IV, da Constituição deste Grande Oriente, que confere ao maçom o direito não só de fazer proposição, mas de vê-la discutida, obviamente nos termos das Leis Maçônicas, porquanto, repita-se, não se é de defender o caos).

Penso eu que tal conciliação, sem prejuízo da máxima eficácia de todos esses princípios e normas, compatível dessarte com os sadios valores democráticos, seria aplicar a regra inscrita na cabeça do art. 222 do RG de forma parcimoniosa.

Poder-se-ia objetar, contudo, ser esse critério muito subjetivo, posto naturalmente variarem sobremaneira os graus de parcimônia na ótica de cada indivíduo, que os há de moldá-los conforme as respectivas formações culturais. De fato, essa é uma verdade inexorável.

Então, faz-se necessário chegar o mais perto possível da objetividade, e eu a encontro na concepção do que os Ministros do Supremo Tribunal Federal costumam chamar de inconstitucionalidade chapada. No caso, seria esse o balizamento para a imposição do caput do dispositivo, ou seja, o Venerável somente o aplicaria quando apresentada uma proposição flagrantemente ilegal; que não deixasse o menor resquício de dúvida a tal respeito.

Visando a imprimir maior clareza quanto a presente ideia, é de bom alvitre citar alguns exemplos, quais: o parágrafo 3º do próprio artigo, a vedar proposições que atentem contra a existência do GOIERN; outro: proposta que vulnere “A divisão da Maçonaria simbólica em três Graus.”, a “Obrigação dos maçons de se reunirem em Loja.”, “A crença em Deus.” bem como “O Sigilo.” (respectivamente os Landmarks 02, 09, 19 e 23, segundo Makey); outrossim, proposta que vise à extinção do Poder Legislativo; ou do Poder Executivo; ou do Poder Judiciário (Título V, Capítulos I, II e III, da Constituição da Ordem); ou que torne prescindível a eleição para os cargos de Venerável, Primeiro e Segundo Vigilantes, Orador e Tesoureiro (art. 159 do Regulamento Geral), enfim, dentre muitos cujo sentido penso estar compreendido nos ora explicitados.

E se mesmo quando adotado o critério sugerido venha a persistir a dúvida, ainda existirá um caminho mais cauteloso que a opção imediata por um dos extremos indicados na letra fria da regra os quais resultam ou na inadmissão incontinenti da proposta ou na sua discussão e votação pelo plenário da Loja após ouvida a Comissão competente. A cautela intermediária é, preliminarmente, submetê-la à Comissão de Legislação e Justiça, a qual, por medida de celeridade manifestar-se-á, de uma só vez, tanto a respeito do requisito inerente ao caput, quanto sobre o mérito, se este lhe competir. Depois, aí sim,  ouvido o Orador, no tocante ao primeiro requisito, decidirá o Venerável se a rejeita ou lhe dá seguimento.

É certo que assim procedendo, aparentemente estar-se-á desrespeitando a letra do §2º, porquanto ela prevê o encaminhamento à Comissão competente se a proposta estiver de acordo com a parte principal do dispositivo. Contudo, repito, o desrespeito é aparente. Primeiro, porque, cumpre lembrar, na hipótese alvitrada existe a dúvida quanto a essa concordância. E, segundo, porque a cautela atende com maior vigor à prevalência das fórmulas interpretativas sistemática e teleológica, que, a par de serem as mais prestigiadas no Direito, permitem, no caso, como explicado anteriormente, atender à ordem legal da Maçonaria sem menosprezar o seu espírito democrático.           

Penso que a utilização desses critérios procedimentais é a melhor forma de alcançar a finalidade do comentado art. 222, que é a de preservar incólumes todas as leis de nossa Instituição, porém dentro de uma visão sistêmica e finalista, ou seja, sem ir de encontro a seus princípios. Senão, ele mesmo (o art. 222), caso aplicado literalmente, estará degradando a própria Ordem, e, com ser assim, provocando o efeito contrário ao que se propõe. E, conforme ensina o saudoso jurisconsulto CARLOS MAXIMILIANO, ao discorrer a respeito da interpretação legal sob o prisma teleológico, “Cumpre atribuir ao texto um sentido tal que resulte haver a lei regulado a espécie a favor, e não em prejuízo de quem ela evidentemente visa a proteger.” (In, “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, pág. 156, 10ª edição, Forense).           

O pensamento ora exposto poderia ser novamente contraditado com a argumentação de que no final da regra está prevista a possibilidade de recurso do interessado ao Tribunal de Justiça do GOIERN, de modo que eventual interpretação do Venerável em desconformidade com o pensamento do Oriente Independente poderia ser reformada. Neste ponto eu redargo dizendo que, mesmo interpretando ampliativamente o vocábulo interessado como indicando não só o propositor, mas qualquer outro irmão presente, ainda assim a decisão singular vulneraria o sistema, porquanto só o debate; a “fricção de cérebros” (como dizia o festejado Ministro JOSÉ DELGADO em sala de aula); o contraditório, farão emergir a clareza da proposição e, consequentemente, a totalidade dos verdadeiros interessados. E carente dessa completude, repito, o sistema normativo restará golpeado.  

Sem falar no fato de que grande parte dos obreiros possui outras formações profissionais que não a jurídica, restando-lhes tão-só a obrigação de conhecer a lei, mas não de saber interpretá-la, a desanimá-los o interesse pela interposição de recursos.

Poderá ainda ser esgrimida a aplicação do §5º do art. 222, que possibilita a reapresentação da proposta rejeitada, desde que após sessenta dias da data de sua rejeição.

Muito bem. Sob o ângulo tecnicamente jurídico há de se compreender tratar essa regra somente daquela proposta cujo mérito foi discutido e votado negativamente pelos irmãos, pois quando há o impedimento liminar preceituado na cabeça do artigo, o que acontece é um obstáculo formal e não material, ou seja, a substância sequer é levada ao debate do plenário. Sendo assim, correto é interpretar a expressão “será rejeitada”, presente no caput , como “será inadmitida”. Isto em prol da boa técnica do Direito, cuja prevalência viria a homenagear o próprio espírito normativo com o qual é incompatível a possibilidade de ver repetida, desde que respeitados os sessenta dias regulamentares, a apresentação de uma proposta contrária às leis da Ordem.  

Sem esquecer do disposto no parágrafo único do art. 207, impeditivo da concessão da palavra para a rediscussão de assunto que já tenha sido objeto de decisão da Loja na Ordem do Dia.

Eis aí outro problema. Como conciliá-lo com o antes citado parágrafo 5º, que permite a reapresentação da proposta após aquele interregno sexagesimal? É entender que esse parágrafo apenas veda a hipótese da rediscussão inconseqüente, como seja, aquela desprovida de reapresentação da matéria. Contudo, se esta for reapresentada, e sua legalidade já tiver sido anteriormente aceita, então aplicam-se os procedimentos previstos nos parágrafos 1º, 2º, 4º e 5º do enfocado art. 222.

*MM da Augusta e Benfeitora Loja Simbólica Padre Miguelinho
(Trabalho oriundo de instrução conferida em 17/09/2009 na Loja Pe. Miguelinho, e dedicado a todos os irmãos Oradores e componentes das Comissões de Legislação e Justiça, nas pessoas do Grande Orador MI João de Deus, Grande Procurador MM Carlos Joilson, Orador MM Rodrigo Falconi, e Orador MM Gladstone Heronildes).

Nenhum comentário:

Postar um comentário